domingo, 20 de novembro de 2011

Me virás

Me virás branco, cabelos medianos, barba por fazer, fazendo o tipo Che Guevara moderno, trotskysta, taurino, ereto, firme e sensual. Nos devoraremos feito bixos rolando pelos azulejos brancos do teu apartamento, me pegará pela nuca me chamando de anarquista. Depois, nus, deitados na cama discutiremos sobre a questão do sujeito revolucionário diante da restruturação produtiva, a concepção de revolução cultural em Mao, a expulsão dos bakuninistas da 1º internacional, os levantes na Líbia. Tu me surprenderás com café na cama e uma poesia do Mayakovsky. Nossas diferenças darão um toque irresistivel a manutenção dessa relação. Cresceremos juntos, nos cortando vez em quando. Mas nos amaremos com sinceridade. No fundo, nos atrairemos pela ideia de dormirmos com o inimigo. De nos entregarmos ao inimigo, de termos o inimigo em nosso colo, completamente entregue e indefeso. Seremos ainda asssim companheiros de luta e de vida.

Não.
Me virás moreno, cabelo raspado, olhos tristes, sorriso com covas, ombros irresistíveis. Virás músico, carregando sensibilidade e criatividade de artista, ainda que com um ar de cançaso e tédio diante da vida que eu saberei compartilhar. A gente vai se encontrar juntando nossas solidões de deuses decaidos. Tu vais tocar pra me seduzir, fingindo casualidade. Eu vou me encantar, me fazendo de distraída. Um dia acordarei antes de ti e te olhando dormir, um afeto sem tamanho tomará conta de mim. Teu chero será meu novo ópio, mas guardarei segredo até que tu me corresponderá me surpreendendo quando, ao acordar, eu perceber que estavas a me olhar ternamente enquanto eu dormia. Andaremos de mão dadas na praia em silêncio, me darás uma flor, me ensinará a chêrar. Até que numa madrugada no meio da semana não nos conteremos em dizer que nos amamos enquanto teu corpo penetra no meu. Nosso sexo será quase dolorido de tão quente, porém lento e por vezes violento.

Não.
Virás rebelde, mais novo, irresponsável e inconsequente. Olhar desafiador transpirando uma originalidade que beira a loucura. Nos beijaremos com velocidade, como se o mundo fosse se acabar amanha. Me permitirei me encher novamente de juventude. Seremos Eduardo e Mônica modernos. Frequentaremos shows de rock, beberemos vinho barato na praça. Cometeremos atos de delinquencia pela madrugada, por pura diversão. Dormiremos abraçados esperando o corujão. Treparemos no sofa da sala, com sua mãe no quarto. Fumaremos um beck sem economizar charme. Daremos beijos de língua em público, intencionalmente provocantes e imorais. Tua imaturidade, tua insegurança, teu medo da rejeição te fará agressivo e me ferirá, mas eu saberei te deduzir e ao contrário de revidar ou te fazer perder a graça te olharei nos olhos, te deirei algumas palavras duras e me despindo de máscaras e artifícios te farei se desarmar e então te beijarei ternamente acariciando seu rosto; você fará o mesmo. Assim, me ligarei de forma perigosa e inconsequente a ti. Viveremos rápido e morreremos jovens.

Não!
Me virás mulher. Linda, com uma feminilidade sutil, inteligente, independente, toda dona de si. Me perderei nas tuas belas pernas e provarei o teu mel sem nojo ou comedimento. Te pegarei pela nuca, serei teu homem e tua mulher. Do tempo, do encontro e do desejo nascerá o amor, e é provável que não tenha amor que valha mais. Virá, então, o olhar do outro pra nos condenar. Eu, fraca, me afastarei de ti, pra depois com uma flor na mão e um pedido de desculpas na outra me entregar a ti, mesmo a durar penas. Será meu chão, meu céu. Mar de carinho e prazer. Assim, descobrirei o lado obscuro da minha lua e ao teu lado serei mil vezes mais eu.


Não!...

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