quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Ruiva

Primeiro eu preciso te dar outro nome pra evitar te chamar pelo teu que me faz tremer só de pensar em pronunciar. Serás Ruiva; minha Ruiva.

Ruiva, fico a imaginar por onde tem andado as tuas belas pernas. Tuas pernas compridas e torneadas, antes sempre à mostra, agora sempre cobertas de calça jeans, até isso o trabalho destroi: a paisagem das tuas pernas a caminhar por qualquer canto, não importa o que tenha ao fundo. Tuas pernas longas me fazem te botar num altar e te adorar como a um deus pagão, pior, uma deusa, e eu não me canso de profanar em teu nome.
Ruiva, já fiz tanto rebuliço com isso que eu nem sei que nome dar. Já tentei modelar feito massinha, transformando em outra coisa bonita como uma amizade; já tentei tocar fogo e transformar em cinzas, e nada! Isso parece que não morre e também se morresse acho que me levaria junto. Às vezes é sede sem fim do teu cheiro, teus cachos, teus seios; outras é uma dor latente que permanece ali, esteja eu em Paris ou na sarjeta. Às vezes é tão doce como só uma ilusão pode ser. Às vezes é desesprero, me faz errar pelas ruas bêbado e perdido, feito louco murmurando teu nome, alucinando teus beijos. Às vezes, raras vezes, me sinto limpo e separado de ti. Mas basta um pensamento, um lugar, um cheiro, uma palavra, uma dose, uma coisa besta qualquer pra esse redemoinho me puxar de volta, Ruiva; és minha maldição e minha glória. Sei que nasci pra anti-herói; tu serás minha para-sempre-Dulcinéa. Por ti viverei todos os meus dias, nem que seja para, a cada dia, me certificar de que todos os dias são dias perdidos sem ti, minha Ruiva, minhas pernas, meus cachos, meus seios que não são nem nunca serão meus, mas de outro. Outro a quem tu dá tão generosamente, tão facilmente, tão baratamente, Ruiva, sua vadia!, a felicidade dos teus encantos.

Por mais que eu chafurde e me debata, me corte e me remende, me faça teu capacho e, por vezes, tenha vontade de te espancar; não te quero mal. Não te quero presa, não te quero triste, não te quero outra. Talvez nem te queira minha...

Mas lembrar do dia que te tive ali, ao alcance das mãos...

Queria eu voltar pra aquele dia e começar tudo do zero de novo. Te falaria qualquer coisa que te chegasse ao coração ou as entranhas, tanto faria eu segurar tua mão ou enfiar o dedo na tua buceta, não importa, mais cedo ou mais tarde os dois caminhos se cruzariam, nos enlacariamos e nos uniriamos e não nos separaríamos, pois não haveria tempo para que pudessemos nos separar. Porque eu me perderia no infinito dos teus olhos onde eu me veria, onde eu te veria, onde eu me veria te vendo me vendo. No fundo dos olhos, como no fundo de qualquer poço, há sempre um infinito pra gente se perder e nunca mais se encontrar. Poderia chamar de loucura, mas chamo Ruiva.
... no fundo do poço profundo dos teus olhos eu me perderia e morreria nos teus braços, entre tuas pernas, sentindo o cheiro dos teus cachos misturado ao de teus seios, fluidos e entranhas. Seriamos enterrados um ao lado do outro, ou seriamos cremados e tuas cinzas seriam postas juntas às minhas...

Não! não quero anel, papel, filhos, promessas, futuro, velório, cremação, enterro, sequer quero palavras; é tão pouco o que quero de ti que me sinto um mendigo diante de tudo isso que eu nem sei nomear. Poderia chamar amor se não me parecesse tão inadequado. Às vezes fico tão confuso que me pergunto se tu realmente existe, mas afasto logo pra longe esse pensamento, afinal aquelas pernas, aquele balançar de quadris, aquele cheiro... não poderia ser uma ilusão, pois de mim nunca sairia algo tão increvelmente belo, divino, doce, sedutor, ah, Ruiva, como tu me perturba vez em quando.

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